Não estamos falando de um novo empreendimento imobiliário. Muito menos estamos falando de um filme independente. “Hotel e Spa da Loucura” é o nome dado ao projeto que o médico imunologista e ator Vitor Pordeus criou no Rio de Janeiro, que já se tornou um velho conhecido dos apreciadores e defensores da arte como terapia. Sucessor da psiquiatra Nise da Silveira, ele desenvolve práticas diferenciadas para o tratamento de doenças psíquicas, que incluem trabalhos coletivos, peças de teatro, arte e estudos. Na verdade, Vitor usa métodos integrais, de psiquiatria transcultural, para unir arte e ciência. Nesse caminho, passaram-se mais de cinco anos de aprendizado e experiências bem sucedidas.
No teatro DyoNises, que fica dentro das instalações do “Hotel da Loucura”, os usuários e funcionários são convidados à encenarem peças e exercitarem sua capacidade de se comunicar através da contação de histórias. A grande questão aqui é a não diferenciação de pessoas. Lá, em cima do palco, todos são tratados como iguais, todos são atores de uma mesma peça.
A dinâmica de hotel é bem aplicada e coerente. Existe uma recepção, onde não são cobradas diárias, mas são vistas algumas “fichas” de usuários. Os clientes-pacientes são sempre bem vindos e bem tratados, mesmo se o hotel estiver “lotado”. Existem nove quartos à disposição, com dezoito camas, em ambientes super coloridos e decorados pelos próprios visitantes. O médico-ator também é coordenador da Universidade Popular de Arte e Ciência (UPAC), cuja sede é o próprio Hotel e Spa da Loucura, além de ser assessor de cultura da Secretaria de Saúde do município do Rio de Janeiro. Quem visita o Hotel pode observar num primeiro momento que a convivência entre artistas, profissionais e usuários expõe a fronteira delicada entre ficção e realidade, entre loucura e lucidez. Frases soltas ou ensaios decorados? Experimentações artísticas ou alucinações? Tanto faz. A criatividade é geradora de saúde.
Vitor defende com convicção seus métodos e suas experimentações: “Em estados de adoecimento mental, a dança, a música e a poesia são mais simples e mais eficazes no processo de reabilitação.” Ele une a teoria de humanização do atendimento ao conceito de “afeto catalisador” defendido por Nise da Silveira, médica que revolucionou o tratamento psiquiátrico no Brasil, nos anos 50, ao mudar a rotina do então Hospital Pedro II. Nise se opôs ao uso indiscriminado do eletrochoque e, no seu lugar, receitava pincéis aos pacientes nas Oficinas de Terapêutica Ocupacional. “Fiz uma descoberta médico-imunológica importante: a vacina contra a loucura é o teatro”, disse Pordeus. Desde então, ele passou a deixar algumas prescrições médicas no lobby do hotel, para todos os tipos de hóspedes. No lugar dos neurolépticos e antipsicóticos, medicamentos utilizados para o tratamento da esquizofrenia, as prescrições incluem textos de Carlos Drummond de Andrade, Fernando Pessoa, Bertolt Brecht, Arnaldo Antunes, além da construção coletiva de saraus de poesia e de música, oficinas de teatro e de dança e sessões de cinema.
Conheça mais a fundo o início da história do Hotel e Spa da Loucura, seu idealizador e o tipo de trabalho que pretendem (e estão conseguindo, de maneira primorosa, realizar). Acesse: https://www.youtube.com/watch?v=XCVsm-_B_pU
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