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O STF e a União Estável Homoafetiva: O que a Saúde e o Direito tem a ver com isso?

STF_TL_AE_uniaohomoafetivaO Supremo Tribunal Federal decidiu, por unanimidade, que a união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo constitui entidade familiar, como união estável (Código Civil, art. 1273). As conseqüências dessa decisão são práticas e efetivas. Direitos como a inclusão em planos de saúde, previdência, associação como dependente em clubes e sociedades, dever de alimentos em caso de necessidade, divisão de bens adquiridos na constância da união, direito à herança, usufruto dos bens do falecido e acompanhamento de parceiro em instituições hospitalares são garantidos. Sérgio Carrara (CLAM/IMS/UERJ), Kenneth Rochel de Camargo Jr (IMS/UERJ) e a coordenadora do Lappis Roseni Pinheiro comentaram os aspectos jurídicos e sociais dessa questão com exclusividade ao BoletIN. (Foto: Divulgação)

Para o antropólogo Sérgio Carrara (Centro Latino Americano de Sexualidade em Saúde/CLAM/IMS/UERJ), a decisão do STF foi justa e fundamental no sentido da integração de uma população tradicionalmente vítima de discriminação e exclusão social. “Do ponto de vista do Judiciário, representa a conclusão de um longo processo de reconhecimento paulatino dos direitos civis de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais por juízes e tribunais por todo o país”, informa. “Do ponto de vista social, a decisão tem um enorme efeito simbólico no sentido de oferecer novos parâmetros para a discussão e para o processo político. Nesse sentido, reforça a luta dos movimentos sociais”. Carrara acredita também que a adoção de filhos para um casal homoafetivo poderá ser viabilizada. “Seria estranho reconhecer uniões entre pessoas do mesmo sexo como entidades familiares e vedar a possibilidade de criação ou adoção de filhos”.

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Mas o antropólogo alerta que, do ponto de vista da equiparação dos direitos civis, a lei do casamento deve ser alterada ou também reinterpretada para que a legitimidade das relações homossexuais seja estabelecida de modo mais definitivo. “Embora não haja diferenças entre união estável e matrimônio do ponto de vista dos direitos e obrigações que comportam, a lei da união estável supõe o reconhecimento de uniões pelo estado independentemente da vontade dos envolvidos. O matrimônio é ato voluntário e culturalmente envolto em convenções que dizem respeito à aproximação sexual e afetiva, ao namoro, ao noivado etc”.

A decisão o STF e o SUS

Para o médico, professor e pesquisador do Lappis Keneth Rochel de Camargo Jr, ainda é difícil avaliar, no âmbito do Sistema Único de Saúde, a extensão que o benefício da decisão concedida pelo STF vai trazer aos casais homoafetivos. “Essa decisão está diretamente ligada ao conceito de saúde como bem estar, felicidade e ao direito à atenção, de ter um acompanhante no caso de uma internação, por exemplo. Mas é apenas uma parte do todo. Acredito que deve ajudar a diminuir a discriminação também. Antes, em caso de morte, quem teria direito à herança devido à união estável, na maioria das vezes, era expulso do local em que vivia pela família”.

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A coordenadora do Lappis Roseni Pinheiro acredita que se trata de um Direito humano à vida, de ser, e está ligado à questão da igualdade, ao respeito à diversidade, à pluralidade, à diferença. “Penso e tenho a convicção que a decisão do STF, tanto do ponto de vista institucional, ou seja, no acesso ao cuidado no SUS, quanto do ponto de vista do processo civilizatório da sociedade brasileira significa uma conquista inestimável. Inestimável porque possibilita garantir a equidade das relações”.

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A professora e pesquisadora também acredita que a decisão traz consigo uma questão da transformação cultural. “Isto porque quando reconhecemos a união estável para casais homoafetivos como sendo uma entidade familiar. Esse reconhecimento nos remete, obrigatoriamente, uma discussão, que é cara para a área da saúde, que diz respeito ao conceito de família. Tem a ver com a perspectiva afetiva, amorosa e de construir um futuro”, afirma. “Essas pessoas, numa união estável homoafetiva, também estão pensando no futuro e por isso elas têm todo direito do mundo de se colocar, se apresentar e ser visível no conjunto da sociedade. Acredito muito no Direito como uma forma de exercício democrático, que Hannah Arendt nos aponta como espaço público do encontro. Trata-se de uma reconfiguração de uma perspectiva política do agir em saúde como realização daquilo que chamamos garantia dos Direitos Humanos”.

Exercício dos princípios universais do SUS

Exercício democrático que, para Roseni Pinheiro, está alinhado com a idéia dos princípios universais do SUS e com a discussão de integralidade. “Tem a ver, por exemplo, com a forma de integração com os programas estratégicos e a estratégia da saúde da familia. Por exemplo, tem que se pensar na saúde da mulher, independente de sua orientação sexual. O mesmo se aplica a saúde do homem, assim como na saúde das crianças que são adotadas ou não por casais homoafetivos”, diz. “Para mim, é uma revolução do ponto de vista de uma constituição da práxis da política de direito, onde as pessoas se sentem incluídas. Entendo que essa decisão nos ajuda a combater a discriminação, afinal não se trata de cidadãos de segunda classe, ou sub-cidadãos, mas cidadãos que independente de sua orientação sexual pagam os impostos. Logo tem direitos de acesso, como qualquer cidadão brasileiro. Temos responsabilidades de combater toda forma de injustiça social. Então, o SUS significa o pleno exercício do direito inalienável à saúde, pelos qual trabalhadores do SUS, os gestores dos SUS e os usuários devem lutar para garantir o acesso para todos, portanto não nos cabe fazer qualquer julgamento de valor, mas efetivar direitos. Isso é que penso ser o exercício dos princípios universais do SUS, dentre eles a integralidade”.

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