No final de março, a presidenta Dilma Roussef e o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, lançaram em Belo Horizonte a Rede Cegonha, programa nacional de combate às práticas que acabam influenciando as altas taxas de mortalidade materno-infantil no Brasil. De acordo com o Programa, o Sistema Único de Saúde (SUS) deve garantir a todas as brasileiras o direito a um atendimento humanizado que começa na gravidez, passa pelo pré-natal e parto e prossegue até os dois primeiros anos de vida do bebê, provocando uma mudança no modelo assistencial no país.
Situado em Belo Horizonte, o Sofia Feldman é responsável hoje por 1/3 dos partos realizados na capital mineira e atende a 95% dos encaminhamentos da Central de Internação, dando garantia de acesso à usuária do SUS ao serviço de saúde. (Imagem: Logotipo do Rede Cegonha, estilizado pelo artista Romero Britto).
Confira a entrevista realizada por email com a assistente social Gislene Oliveira Nogueira, o obstetra João Batista Marinho de Castro Lima, a enfermeira Lélia Maria Madeira e a fisioterapeuta Tatiana Coelho Lopes, que integram o quadro de profissionais do Hospital Sofia Feldman.
BoletIN: O que a implementação do Programa Rede Cegonha traz de diferença para as usuárias do SUS?
A primeira diferença está nos recursos financeiros, que são significativos – R$ 9 bilhões e 300 milhões de reais. Isso é uma grande diferença, além do envolvimento pessoal da presidenta Dilma Rousseff e da ênfase dada à mudança de modelo assistencial, a organização da Rede de Cuidados, o envolvimento de todo o Ministério da Saúde, como prioritário, e de outros ministérios, tais como o da Defesa e da Educação, monitorados pelo Ministério da Casa Civil.
BoletIN: O programa prioriza as regiões da Amazônia Legal e do Nordeste e as regiões metropolitanas que têm a maior concentração de gestantes. Por quê?
A prioridade agora é iniciar por algumas regiões metropolitanas: Belo Horizonte, Curitiba, Campinas e Porto Alegre. Belo Horizonte, Curitiba e Porto Alegre, porque já existe uma organização e uma rede de assistência formada. São regiões mais avançadas e servem de modelo para a Rede Cegonha, de inspiração para as outras regiões. E as regiões da Amazônia Legal e Nordeste, escolhidas por terem os piores indicadores, em relação ao restante das outras regiões.
BoletIN: Como vem funcionando a Rede Cegonha em Belo Horizonte, nesses três primeiros meses de implantação?
A Região Metropolitana avançou bastante nos últimos anos, com as mulheres fazendo pré-natal nas unidades básicas de saúde, onde recebem informações sobre em qual maternidade terão seus filhos, evitando a peregrinação da mãe procurando por vagas. As enfermeiras do Programa Saúde da Família visitam a usuária do SUS em sua casa no quinto dia de vida do nenê. Temos uma rede física, que engloba a unidade assistencial, que presta serviços à mulher desde o período pré-concepcional até a criança com dois anos. Ela se dá nas unidades básicas de saúde, secundárias e nos hospitais. A Comissão Perinatal da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte reúne-se constantemente com o município e o estado. Ou seja, parte dos programas da Rede Cegonha já funcionam em Belo Horizonte.
BoletIN: E como o Hospital Sofia Feldman, uma referência em humanização no cuidado em assistência materno-infantil, se integra à Rede Cegonha?
Existia no Brasil uma rede com funcionamento fragmentado, desorganizado. A rede, metaforicamente falando, estava furada. Aqui em Belo Horizonte, o tecido da rede é mais resistente, pois estamos construindo há muitos anos. Temos espaços coletivos de conversa e decisão política da Secretaria Municipal de Saúde, com a criação da Comissão Perinatal. Há sempre conferências, encontros técnicos com os conselhos de saúde, unidades básicas de saúde e trabalhadores. Profissionais, usuários e gestores estão construindo essa rede há dez anos. O Hospital Sofia Feldman é um dos hospitais que servem de modelo para o desenho da Rede Cegonha. O Hospital está bem avançado, tem uma assistência centrada na família e na criança, respeito à autonomia da mulher e da família, assistência com bases humanísticas e baseadas em evidências científicas. Alguns programas preconizados pelo projeto já estão implantados no Hospital Sofia Feldman, como o Centro de Parto Normal, a Casa da Gestante Zilda Arns (que acolhe a gestante com gravidez de risco) e Casa de Sofias (onde ficam as mães que tem nenês na UTI neonatal. Nós temos espaços de discussão construídos, que reúnem a Secretaria Estadual de Saúde, Secretaria Municipal de Saúde, trabalhadores, gestores e representantes do controle social. Em 2010 reunimos cerca de 100 pessoas no 7º Planejamento do Hospital Sofia Feldman, com o tema ‘Ninguém dá conta do cuidado sozinho’.
BoletIN: E quais os maiores desafios do programa?
A Rede Cegonha é um grande desafio. Há lugares em que a rede está muito desconstruída, por questões políticas, financeiras ou por falta de conhecimento suficiente e qualificação técnica. Na parte estrutural, vai intervir com recursos financeiros, monitoramento, avaliação dos indicadores e avaliação do melhoramento. O grande diferencial é o apoio institucional do Ministério da Saúde, no ponto de vista técnico. O Ministério saiu de Brasília e chegou aos municípios.
BoletIN: Pelo programa estão previstos atendimento adequado desde a confirmação da gravidez até um acompanhamento durante os dois primeiros anos de vida do bebê. O que significa isso na prática?
Todos esses objetivos serão implementados, conseguindo refletir em todas as ações. Por exemplo, com o Planejamento Familiar na Rede Básica, evitamos a gravidez indesejada e os abortos provocados, em conseqüência, haverá a redução da mortalidade materna e infantil.
BoletIN: Em relação aos profissionais, existe algum projeto para capacitação dos envolvidos no programa?
Sim. Já está acontecendo o Programa de Qualificação das Maternidades. Os profissionais do Hospital Sofia Feldman estão indo aos estados localizados na Amazônia Legal e Nordeste, orientando sobre a mudança do modelo assistencial em 26 maternidades dessas regiões.
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